22 abril 2006

Meus 12 anos e o Abbey Road

Escrevi aqui uma vez que as escolas acabam por afastar os jovens da boa leitura ao obrigá-los a ler coisas inadequadas para sua idade. A mesma coisa acontece com as aulas de catecismo. Aos 12 anos ninguém está interessado em aprender verdades metafísicas. E a cartilha dos padres, ao pé da letra, já não convence a geração da internet (não convencia nem a minha, que é a geração da TV).

Aos 12 anos, eu estava começando a ouvir os Beatles, estimulado pelo circo de mídia armado em torno da morte de John Lennon. Adorava (adoro) Imagine, Woman e outras só de Lennon, além de Help, Love Me Do, Yesterday e toda a fase inicial do quarteto.

Foi quando um vizinho, mais velho, me emprestou o Abbey Road, dizendo ser o melhor de todos. Fui ouvir ansioso, mas... decepção! Tirando as duas do George Harrison (a romântica Something e a alegre Here Comes the Sun) achei o disco um lixo. Não entendi nada, aquelas guitarras distorcendo, uns sons estranhos. Devolvi o disco e guardei na cabeça que Abbey Road era um trabalho dos Beatles decadentes, já perto do fim.

Passou o tempo. Na adolescência conheci Rolling Stones, Led Zeppelin, Deep Purple, Black Sabbath, Rush, Yes, B.B. King, Pink Floyd. Aprendendo a tocar guitarra, aprimorei meu ouvido para timbres, melodias e letras de rock e blues.

Já na faculdade, caiu na minha mão novamente o Abbey Road. Nem quis ouvir, porque tinha na lembrança que era muito ruim. Mas botei pra rodar e ... delirei! Tinha Come Together, Oh Darling, I Want You e outros rocks de primeira, além da seqüência de canções emendadas no lado 2 (era o tempo do LP), depois de Sun King. Chapante!

Até hoje, ouço o Abbey Road sempre que posso. Pra mim, é o melhor disco dos Beatles e um dos melhores trabalhos de toda a história da música, pelo menos desde que inventaram a gravação sonora.

Moral da história? Bem, às vezes a gente tem que deixar de lado as impressões de quando tinha 12 anos e tentar rever as coisas com olhos mais experientes.

21 abril 2006

Sidarta Gautama

Numa terra distante, há muitos anos, nasceu um príncipe. Chamava Sidarta Gautama. Seu pai, a fim de poupá-lo das mazelas do mundo, não o deixava sair do castelo onde morava. Lá havia abrigo, conforto, amigos, festas, bebidas, mulheres, tudo o que ele precisava.

Os anos passaram. Já quase adulto, Sidarta um dia convenceu um dos guardas a deixá-lo passear fora do castelo. Assustou-se com o que viu:
- Quem são aquelas pessoas, tão sujas e magras? – perguntou ele ao guarda.
- São os pobres, príncipe. Eles não têm o que comer.
- E aquelas crianças, por que choram tanto?
- Porque seus pais não têm trabalho, e elas sentem fome.
- E aqueles homenzinhos pequenos, de cabelos e barbas brancas, gemendo sem parar?
- São os velhos e doentes, príncipe. Eles se preparam para morrer.
- Mas o que é morrer?

E assim foi o dia todo, Sidarta aprendendo que o mundo não se resumia ao seu castelo encantado. Perturbado, abandonou família, reino, castelo e saiu pelo mundo, buscando entender o porquê de existir tanto sofrimento.

Sidarta então percorreu terras e mares investigando os mistérios da existência. Conheceu os sábios ascetas do oriente, que renunciavam à vida em busca da iluminação espiritual. Passou a fazer parte do grupo: vivia meditando à sombra de uma árvore, alimentando-se das frutas e raízes ao seu redor.

Dias viravam meses, meses somavam anos, e Sidarta e os outros ascetas continuavam lá, sentados sob as árvores, esperando a grande luz cair sobre suas mentes.

Até que Sidarta notou um casal de esquilos que passeava por perto. Os animaizinhos corriam, colhiam suas nozes e comiam com prazer. Depois, debruçavam-se sobre o lago para beber água. Então namoravam um pouco. Não se preocupavam com nada, só viviam. E pareciam felizes assim.

Daí Sidarta levantou-se e mergulhou no lago para um bom banho (que não tomava fazia anos...). Os ascetas, apavorados, diziam:
- Sidarta, o que está fazendo? Vai voltar ao castelo? E a iluminação?
- Descobri que rejeitar os prazeres é um erro tão grande quanto viver só pelo prazer. O melhor caminho é o caminho do meio.

Dito isso, Sidarta aceitou o convite de uma família camponesa para viver com eles. Sua vida era de paz e amor: trabalhava, cantava, divertia-se nas festas. Mas também orava, pensava no seu próximo, tentava ajudar as pessoas. E reservava alguns momentos para meditar em silêncio, em busca da força espiritual.

Num desses momentos de meditação, aconteceu algo diferente. No lago à sua frente ergueu-se um monstro, a mais horrível criatura que ele já vira. O monstro primeiro tentou assustá-lo, mas Sidarta não teve medo. Então, a criatura ofereceu dinheiro, poder, prazeres, tudo o que Sidarta quisesse para ir com ele. Mas Sidarta não deixou o desejo dominá-lo.

O monstro ficou furioso, debateu-se de raiva e caiu, consumido pelo próprio ódio. Suas feições foram então se acalmando, modificando-se, até que Sidarta reconheceu: não era monstro algum, apenas seu próprio reflexo – dele, Sidarta – refletido na água.

Nesse dia Sidarta derrotou o maior inimigo de todo ser humano – o próprio ego – e alcançou a iluminação. A luz do universo radiou seu espírito e ele ganhou a paz eterna.

Passou o resto da vida contando sua experiência aos outros, ensinando. Mas aí já não era mais Sidarta Gautama. Passaram a chamá-lo de
Buda, que na língua lá daquele povo queria dizer “O Iluminado”.

Aprendi essa história no filme “O Pequeno Buda”, de Bernardo Bertolucci. Não sei se contei direito, pois assisti já há alguns anos. Mas o que me toca é a belíssima filosofia que há na essência do budismo. Essência que permanece, para quem quiser conhecer, não importa o que os homens mal intencionados tenham feito usando o nome dessa religião.

Com o Cristianismo é mais ou menos a mesma coisa. Mas deixa isso para outro dia.

16 abril 2006

Vou falar de religião (mas não agora)

Fiz alguns comentários sobre religião no blog do Arturo Bandini (tem um link aí do lado), só pra responder às suas provocações pascoais. Mas ficou meio superficial, achei. Por isso, fico com o compromisso de escrever aqui algo um pouco mais pensado sobre o tema. Qualquer dia sai.

12 abril 2006

Tempo Rei

"...Ó tempo rei, ó tempo rei
Transformai as velhas formas do viver
Ensinai-me, ó pai, o que eu ainda não sei..."
(Gilberto Gil)
Daqui a alguns minutos completo 37 anos de vida. É bom. Não sei se a vida começa mesmo aos 40, como dizem alguns, porque pra mim sempre foi boa. Mas melhorou a partir dos 25, mais ou menos, conforme fui deixando pra trás algumas inseguranças e tormentos da juventude.
Foi na idade adulta que descobri o que queria de fato fazer da vida (compor canções). Na mesma época, passei a acreditar em Deus e a sentir, pela primeira vez, a vontade de ter filhos. E, acredite, esses três fatos aconteceram necessariamente nesta ordem e estão diretamente relacionados um com o outro.
Mas o que eu queria mesmo dizer é que não compactuo com este culto à juventude que existe por aí. Acho legal ir ficando mais velho. Como na canção do Gil, o tempo é mesmo o rei, que nos ensina tudo e cobra muito pouco por isso. Pois as rugas, cabelos brancos, dores nas costas, colesterol e tudo o mais são um preço bem pequeno a pagar pelo que ganhamos em troca.