10 outubro 2005

Trabalho e emprego

Estou em férias, por 20 dias. É bom. Nada contra trabalhar para ganhar a vida, mas o modo como as pessoas trabalham hoje é irracional. No meu caso, são oito horas diárias, mais uma para o almoço, duas de ônibus para ir, duas para voltar... 13 horas por dia! Sobram nove horas para dormir, tomar banho, jantar, ficar com a família, divertir-se... Tem algo errado aí, não tem?

Mas, dirá você, é melhor do que não ter um emprego. Tá. Mas se o trabalho fosse feito de uma maneira mais, digamos, humana, não precisaria haver desemprego. Há muita gente sem emprego, mas os que o têm trabalham muito, em situação de stress, enfrentando uma competição maluca e neurótica. Correm o dia todo, cumprem uma tarefa após a outra, mas chegam ao fim do dia com a sensação de que não deu tempo para fazer nem a metade do que era preciso.

Me parece óbvio que, reduzindo a carga daqueles que trabalham, surgiriam empregos para muita gente. A questão é que aí as empresas ganhariam menos dinheiro. Hmmm.... Mas também parece um tanto óbivio que, se houvesse mais gente empregada, haveria mais consumo, e as empresas acabariam vendendo mais, e assim teriam de produzir mais e contratariam mais gente e... Economia é isso, ou não?

09 outubro 2005

Bob não é bobo

Devorei “Crônicas”, do Bob Dylan. O estilo, como era de se esperar, lembra muito os beats Jack Kerouac (“On The Road”) e J.D. Sallinger (“O Apanhador no Campo de Centeio”), com longas frases e uma adjetivação meio maluca. Coerente com a música dele. No conteúdo, revela um sujeito com um tremendo respeito pela arte e uma inquietação admirável.

Aos 20 anos, Bob é um desconhecido que chega a Nova York com o sonho de entrar para o grupo restrito da música folk. Acaba em uma grande gravadora e vira astro nacional (o livro não conta essa parte, mas a gente sabe). Dez anos depois, ele se enche disso e grava um disco contrário ao som que o tornou famoso (o tal “New Morning”, que aliás nunca ouvi).

No outro capítulo, lá pelos 50 anos e considerado ultrapassado, ele reinventa seu jeito de tocar e faz um disco que é aclamado até hoje (“Oh Mercy”; também não ouvi, mas li muito a respeito na época – 1989 – e lembro que foi mesmo bastante elogiado). Ou seja: quando ninguém o conhecia, queria ser famoso; quando virou astro, quis ser esquecido; quando o desprezaram, provou que ainda estava vivo. Pode parecer que o cara não sabe o que quer, mas eu chamo isso de não se acomodar. E eu gosto.

Já sabia que o grande referencial de Bob Dylan havia sido o trovador folk Woody Guthrie, mas foi surpresa pra mim a citação que ele faz, no livro, ao bluesman Robert Johnson, que eu ouvia muito na época em que era vidrado em blues. Deu saudades. Vou ligar o toca-discos só pra ouvir de novo: “When the train came to the station, with two lights on behind, the blue light was my blues and the red light was my mind…”

Outra surpresa é quando Dylan se compara (com bastante coerência) a João Gilberto, Carlos Lyra e Roberto Menescal, da Bossa Nova. Curioso: no Brasil, os principais seguidores de Bob Dylan vieram do Nordeste. Pense em como são dylanescos, cada qual ao seu modo, o cearense Belchior, o pernambucano Geraldo Azevedo e o paraibano Zé Ramalho.

Como intérprete, o baiano Caetano Veloso tem uma das melhores versões que já ouvi para uma canção de Bob Dylan: “Jokerman”, de 1992 (só perde, acho, para “All Along the Watchtower” com Jimi Hendrix). “Jokerman” originalmente era uma homenagem de Dylan ao então presidente americano Ronald Reagan. Caetano cantou-a no show “Circuladô”, que tinha uma canção, “Fora de Ordem”, inspirada em um discurso de George Bush Pai (que foi vice do Reagan). “Crônicas”, com sua linguagem beat e sua sinceridade eloqüente, vem a calhar no mundo atual, em que Bush Filho reina nos EUA e, aqui embaixo, a gente não sabe mais a diferença entre Maluf e Zé Dirceu.

02 outubro 2005

Trilha sonora

Continuo aproveitando as duas horas diárias de ônibus para ouvir CDs. Na semana que passou teve "Pearl", último disco da Janis Joplin, com as ótimas "Mercedes Benz" e "Me and Bob McGee". Ela cantava pra caramba, mas o instrumental era mais ou menos. Fico pensando se ela tivesse formado na mesma banda do Jimi Hendrix, que morreu no mesmo ano.

Ouço também um CD com "O Quebra-Nozes" e "O Lago dos Cisnes", de Tchaikovsky, tocados pela Orquestra de Londres. Fiquei com vontade de ouvir isso depois de assistir, com minha filha, os desenhos da Barbie inspirados nesses dois balés clássicos. É não é que são bonitos? Música pra ouvir de olhos fechados, transportando-se pra outra dimensão...

Também fui de Rolling Stones, "Exile On Main Street" (1972). Não tem nenhuma daquelas canções que entraram pra história do grupo, mas é um dos melhores. Uma espécie de tributo ao blues, country, folk, jazz, gospel e todos os sons que, misturados, deram no tal de rock'n'roll. Eletrizante, pra resumir numa palavra.

Pra completar, "Rio 89", ao vivo do Tom Jobim com a Gal Costa registrado em um festival de jazz nos EUA. A qualidade da gravação não é das melhores (muito baixo!), mas a música é de primeira. Começa com Tom e a sua banda de cinco vocalistas lembrando "Desafinado", "Samba de Uma Nota Só" e "Chega de Saudade", entre outras. Com a Gal, tem "Wave" (em inglês; gosto mais dessa do que da versão em português), "Corcovado", "Dindi" e outras tantas. Tom também canta sozinho uma interessante "Waters of March" ("Águas de Março" em inglês). Curiosidade: Mesmo com tantos clássicos, um dos melhores momentos do disco é "Samba of Soho", composta e cantada pelo Paulo Jobim, filho do Tom.